Quantos me vêem?

quinta-feira, 24 de maio de 2012

Ele Ama-Te... Mas Morta.



Teve-a nos braços, desmaiada, corpo cadavérico.
Estava paralisado; a ideia de tê-la nos braços, daquele modo, tanto o excitava como o entristecia.
Embora ele a preferisse de outros modos...


"Ela é bela, seja de que modo for. Quero apreciá-la mais um momento..."
Pálida, quase mármore. Olheiras profundas, negras, horríveis. Cabelos pendentes do rosto e dos braços, negros, negríssimos como breu. Mãos quase frias, pálidas como o rosto, pendentes e suaves. Lábios escuros, roxos, "beijáveis" como ele pensara.


Que fraca.
Pensou que uma dose inteira a faria desmaiar, mas apenas bastara menos de metade. Que fraca.
Menos trabalho teria.
E a sua fragilidade comoveu-o. Que bela.


Ele adorava representar.
Injectou-lhe a dose, mesmo no pescoço, e aí começa o Primeiro Acto, Cena Um.


A frágil dama desmaia, e ele (não fora o culpado de tal desmaio) ampara-a.
"Acudam, acudam, que a dama está enferma! Acudam!"
Mas ninguém responde. (Melhor ainda.)
De tudo faz (pensa) para recuperar os sentidos à dama, mas nada feito.
Pensou num beijo (mas isso destruiria a fantasia.) e percebeu que não seria digno de tal acto.
"Oh deuses, se contemplá-la assim é meu destino, assim o seja"
Fim do Primeiro Acto.


Leve e lentamente ela começara a recuperar as cores.
Sabia que, fraca como ela era, dar-lhe mais uma dose poderia ser fatal.
O que não o intrigava muito.
Segundo ele, ela merecia morrer, por ser tão bela e por rejeitar o amor que ele lhe tinha.
Por outro lado queria-a viva por mais uns tempos. Se iria sofrer, que fosse às mãos dela.
Despiu-lhe as roupas e vestiu-lhe um vestido de noite.
Lavou-lhe o rosto, com carinho.
Deitou-a na cama, bem confortável.  Sim, porque os metade-mortos-metade-vivos também merecem conforto.
Sentou-se junto dela, afagando-lhe por vezes o rosto, os cabelos e as mãos. Lá ficou até ela acordar.


"O que aconteceu? O que me fizeste? Onde estou?"
"Rescuscitaste."
"Que dizes?"
Levantou-se e antes de sair porta fora disse-lhe:
"Salva-te."



Sem comentários:

Enviar um comentário